10.6.07

carta do contratempo.


dear,

tenho quase certeza de que eu estou vivendo um tempo mítico. um tempo no qual os sonhos todos morreram. os sonhos, meus amigos, os sonhos. tudo parece tão distante e impossível quanto o oceano pacífico. el niño dos desejos, lampejos e bocas vermelhas de tanto suor. também de tanto chorar fantasias de heróis desafortunados. eu mesmo um herói sem fortuna sofrendo da malária amazônica, das febres intermitentes e do interdito dos calores. a erótica dos meus verbos se perdeu nos adjetivos. os rumores dos meus sonhos dizem que os temores são pelo irrevogável das vogais negras. um líquor, uma alga, um céu. nunca fui tão imperfeito e mesmo assim fui feito cheio de pretensões, previsões e oráculos. por mais que eu saiba que o destino nunca é uma fatalidade, apago os vestígios como quem coze os pecados, como quem cose os retalhos da manhã cinza. saiba que não há crepúsculos para um só ídolo. apenas o nascer do sol e as lembranças apagadas. amnésia dos totens, dos colossos, dos rostos que coloco no peito e aliso. esqueço para nunca mais, recorto as recordações como pedaços de papel pardo. não consigo encontrar uma palavra sequer que defina meu ânimo, assim como o menino que pisa a formiga não tem consciência da morte. é um perigo viver de sinceridade: a incompreensão é sempre maior se me mostro de cara limpa, sem máscaras e adornos. se bem verdade é ainda mais difícil e perigoso é viver tão só e tão sóbrio num sol de inverno. apaguei os versos dos cadernos, não tenho tempo sequer para uma pulsão de estrela linda.

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