my dear,
não te escrevo porque eu quero, mas porque preciso. rabisco esses papéis pra não colocar minha vida em risco. só não devo colar minha vida no cinzel, e me desfaço por inteiro no que redijo. eu sou eu: agora não sou absolutamente eu: me coloco na relatividade absurda. [assopro o improvável: estou resumido ao coração absoluto, também absurdo e bêbado. isso sou eu: eu te assanho o ouvido?]. nem me quer, mal me quer. invento outras cantigas, ao invés de pétalas, arranco as páginas do que escrevo. e fico fazendo com apuro tantos rascunhos daquilo que não devo. certas solidões não se resolvem com os amigos. o que eu disse já virou rasura, a carta que enviei ficou de extravio. por que não me desloco para o teu ouvido, te conto mesmo de sussurro o que está por dentro? por que eu não te digo que não quero mesmo querendo ser tãoterno e te amar tanto pela noite adentro? e se eu parasse de ser o que eu escrevo e voltasse a ser o que eu era? porque esse quem escreve não sou. só posso dizer da pessoa que existe antes de pousar a pena, sinto pena de mim mesmo por ser duas pessoas ao mesmo tempo. e se eu não te digo a verdade aqui, é porque eu não te falo. se eu falasse, seria mais sincero. então, quando me encontrar, me olha bem nos olhos e tira deles o que eu te quero [dizer]. beijos.
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