21.12.06

carta inacabada



(...) eu não queria estar aqui. à contra-vontade tudo parece um engano, parte de um pesadelo lúcido. me sinto filho de panteras negras: um negrume rondando e rondando. faróis de carros iluminam minhas costas, como fazem os faróis do mar nas encostas perigosas. uma fúria de ouvido me obriga a saber de tudo em cada canto - um gemido, um riso, uma mentira. pressiono tão forte as mandíbulas que temo que meus dentes se estilhacem em mil pedaços diamantados. coloco meu olho no espelho. o que vejo é um arco retesado na íris. flechas disparam num piscar de olhos amarelo-pantera. que me importa o som dos tambores e dos dedos na mesa? as palavras arranham as palavras. as cordas da garganta, cheias de cerol, arranham as palavras. uma garganta do diabo, engolindo centenas de cachoeiras. me entende por que não posso te escrever aos beijos? me cansei da coisa molhada, da água potável que não posso beber. eu não queria, mas tenho que dizer que é o fim da linha e é noite escura na janela das casas (...)

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