2.4.07

walking away.


dear,

os últimos dias de minha vida se parecem tão últimos. distantes, eu diria. quando olho para os eventos que antecedem esta escrita, sinto como se assistisse a um filme antigo. nada ali é meu. nem verdadeiro. há uma distância de um toque de tela. é como se meu corpo tivesse se desdobrado e o duplo que dele nasceu recolhesse as sobras do jantar passado. não reconheço as coisas ao redor. fico mudo por horas no meu quarto. não quero nem ver ou falar com ninguém. mas me esforço para exorcizar do meu corpo este estranho ditador que tomou o poder. minha língua tenta fazer discursos, mas meu quarto me impede. é uma prisão política. e tenho medo de pensar que é uma condição irrevogável. andei colando cartazes de desaparecido pelas ruas da cidade. neles, o meu rosto estampado num retrato preto e branco. no entanto é uma pessoa cinza que os cola. sinto deus por dentro de mim. e deus é um vazio. é a própria fome dos dias. e sem saber o que comer, eu devoro o invisível, engulo a angústia e a incerteza dos tempos. deus e sua úlcera de fogo. caminho a passos largos com rolos de papel nas costas. não me pergunto para onde. apenas me pergunto por que. e o que vai ser do meu corpo quando esse outro me deixar por completo.

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