17.7.07

carta do cavalo negro


oh cavalo negro, das crinas de fogo, tuas patas pisaram meu corpo, tuas chamas lamberam meu rosto. me diz que é fogo-fátuo, me diz que o relincho desaparece e pronto. eu acho que estou galopando em pêlo no desejo. dou muito ouvido aos sentidos do seu dorso. por favor, negro cavalo, quero todos os meus sonhos de volta. não essas coisas arranhadas que acaba me devolvendo. me perdoe por sempre ter desejado escapar do derretimento das fantasias que eu tinha. mas um por um (não todos, mas alguns), a medida em que eu os entregava, foram se fundindo e se confundindo em uma só. queria me esquivar deste fardo que me deixava farto de tudo e tão no escuro. me esquivar dessa despretensiosa maneira de segurar os muros, seguir aos murros, me machucar voluntariamente com tanta dor. sim, eu sei, as coisas são assim: na vida temos um só rumo e na escolha de todos os sonhos permanece apenas um. ficam as ruínas, os velhos casacos, os desgastados cascos de um poema, quem sabe de um cavalo sem versos. eu nada sei de mim: cavalgo palavras sem domínio, quem sabe, sem destino algum.

2 comentários:

Alberto Pereira Jr. disse...

ninguém nunca sabe se si mesmo Márcio.

como sempre tocante!

Anônimo disse...

Daí a necessidade de escrever?
de tornar a memória discurso?
Daí que escrever confere sentido e significado à vida do poeta?
Daí gostar de estar vivo e não da vida?
Daí que somos uma pergunta?
As entrelinhas, Marcio, sabes, entretelam e desfazem sinais e segredos.

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