7.1.09

o amante cativo.

my dear,

acordei e vi a porta entreaberta. você já não estava aqui. havia saído no meio da noite. chegara no fim da tarde, mas se foi antes que a manhã surgisse. a fresta era estreita. ainda assim dava para espiar a luz prateada da lua, a mesma que banhara nossos corpos perigosos na sala de estar. você não está aqui e a destruição é infinita. intuitivamente eu sabia que não iria voltar. certo que logo no primeiro beijo eu desconfiei de que não havia lugar algum para chegar. só nós, ali, naquela hora antes do corpo ir embora e do outro corpo, o meu, sentir sua falta. não sei se tenho mais raiva da surpresa ou da decepção, mas confirmar com os olhos qualquer coisa é algo que arranha o céu da boca, desvia a língua, esmaga a saliva. por alguns segundos pensei em quanto prazer egoísta cabe num objeto. o cinzeiro de prata, a película preferida, o long play raro? qualquer um desses teria mais uso e valor de duração. e que uso e valor estou me dando agora? poderia ser puto e cafajeste só para agradar, só não seria eu. poderia ser só por hoje, mas não quero. também não estou sendo eu agora: contido, displicente, compreensivo a ponto de deixar a corda sumir lá longe onde nem vejo o que vai dar. eu bem sei e me engano: eu sou o amante cativo; os meus sonhos, meu próprio cativeiro.

Um comentário:

Anônimo disse...

tô absurdamente impressionado com a qualidade do teu texto!

Keith Jarret no Blue Note.
já leu esse livro?

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