10.7.09

remetente.

dear,

escrevo do tempo desaparecido do meu corpo. escrevo a bordo do naufragado navio continental. escrevo do suor da leoa na planície africana. escrevo dos três metros que a lua se afasta da terra a cada decênio. escrevo do futuro cataclisma que dobrará o universo por sobre si mesmo. escrevo do quarto do qual não posso sair. por isso espero que minha carta chegue e seque. espero que minha carta voe. espero que esta carta atravesse os umbrais do templo. espero com desespero que ainda haja impulso de partida pra chegar. espero que a metáfora me brilhe e me mate até que a carta chegue. espero mesmo que tudo aconteça em absoluto porque já me arrependo de escrever. parti para a ignorância de rascunhar o passado e juntar com durex as cartas rasgadas. eu sou um ignorante, só posso ser. eu te odeio. por que escrevo? conjurei um nome a tarde toda enquanto dormia: ouvi meu espírito falando comigo mesmo. estou há dias em um marejar bêbado, regredindo àquela hora da qual não preciso nem falar. escrevo um desencantamento que me desamarra as fibras do peito - tenho comigo a mágoa do que não podia ter sido. poderia ter me entendido; e eu, mudado meu tom de voz. não era desnecessário: era pra ser um pedido, era preciso que fosse feito. acontece que preferiu que eu escrevesse ao invés de dizer, preferiu a queda no jardim dos símbolos que a vitória de me querer ainda. por que voltar e não me deixar esquecer? eu preciso da renúncia para não sufocar com o rugido das bocas-de-leão, com a conjuntivite das tulipas e a sombra pesada dos amores-perfeitos. superpostos, os tempos me seguem até o limiar do neutro, naquele intervalo do qual não sei onde quero estar. a história que pode me levar para um futuro tranquilo? a fantasia que pode consumir as flamas do meu presente? ou o passado destrutivo que pode me fazer cair novamente e cair de novo e de novo até a última rasteira? escrevo da incógnita que é meu corpo. escrevo pra quem nada sabe, acho, que para mim mesmo.

2 comentários:

Unknown disse...

oh, sim eu saberia se pudesse te aliviar as dores e te enviasse mil príncipes. apenas para que te visse a rir, sem antes, macular tua escrita. que horror seria!
amado amado, que me vês carrasco na direção, mas sou pai também, de uma paternidade amiga e sincera: ah, que credite desses afetos, eu credito o meu, no teu desamparo (de escrita) é que voou bem longe. como te gosto e te admiro, não tenho por que lhe dar açougue, hehehe. beijinhos do chris \o/

Preta disse...

açougue,
carnes várias
carne, só carne.
de luva facão e muito dinheiro no bolso.

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