13.10.11

a lebre branca


honey:
há muitos anos é esperado o filho de deus. a chegada de alguém que nunca-jamais partiu. o homem não veio do macaco. o macaco veio do homem. deus veio do homem. o universo veio de o quê? do filho do homem. então: o progresso levou às guerras. as ruínas da guerra, a mais progresso. para onde e por quê? eu me perguntava, e pergunto, ainda e muito. volta e meia enlaço-me nas perguntas de sempre, com bravata de quem dá uma gravata e se atira ao chão. double k.o. muitas vezes as respostas, pressentindo minha aproximação, se assustam e desembestam como animais selvagens pelo coração adentro. uma só ficou para trás, como lebre ferida, atravessada pelo disparo e ainda assim feliz. o que quero dizer: há muitos anos era esperada a chegada do amor. e percorria eu a savana seca, de roupas cáqui, botas negras, rifle e tranquilizantes. o jipe ia até o interior do congo pegar o suspiro do último macaco negro, do último parente do homem, de deus, do filho do homem. eu deixava o corpo ir até debaixo do rio, qualquer lugar, seixo, gruta que pudesse abrigar o rufar de tambores. o peito, festivo como cerimônia tribal, era o que eu esperava. já não preciso mais querer nada, posso deitar-me na relva, ser devorado pela pantera negra e servir de pasto aos animais pequenos. é da lebre branca, linda, que falo. fui até tão longe para te encontrar e te jurar uma só vez: de hoje não passa, de nós nunca mais passa. antes os caminhos eram dois ou vários, mas sei que só uma estrada de terra agora eu quero. posso ser devorado, poderia - mas espera, deus, falo a este deus inventado por todos os homens, espera: dá-me mais tempo. é chegado o amor e este afeto precisa de muitos meses para se estender. os quilômetros da áfrica seriam poucos. nem saímos daqui, nem primitivos ainda somos. qualquer tempo seria pouco para nós que corríamos de atrás do outro. e não espero mais nada - nem qualquer outra resposta. quando tu me perguntas se desejo perpetuidade, juro que quero e já nem me importo de onde o universo veio. importam apenas estas tardes preguiçosas e demoradas do cão perdigueiro sobre a lebre branca.

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