20.10.06

french letter.


my dear,

estou me despindo da palavra, mas não nesse instante. me demoro agora diante do espelho. não me vejo mais no que reflito. definho. me aconchego nesse estrangeiro. a superfície é lisa e prateada como um exílio. não sou eu, não sou. estou pronto para uma jornada de faces e reflexos, embora não seja fiel ao retrato, sou leal ao teu corpo, coração. mil vezes você me colando, me dizendo baixo e quase sem voz aquele mantra bonito de quem se ama. mil vezes, também, eu me debruçando nesses cacos de sonho, que eu colo, te dou voz e te faço amar comigo. é tão triste este país estrangeiro, esse espelho desdobrado do meu lado. toda vez que o toco, não te vejo, também não me vejo: é apenas uma imagem dentro de uma imagem, um desejo dentro de um desejo. eu me perdi por aí, sabe lá onde você me deixou. entreguei-te todo o de dentro, mas recusou, em silêncio, e me abandonou em algum vento. não pude me pegar de volta. por isso, amor, é que sou um vampiro diante do espelho. je ne suis pas moi. je ne suis pas ici. o francês me arranha a garganta, quedo rouco e louco por um roubo de beijos. cleptomania, sim, mas eu te furto e nem se importa. o que não me acalma, é que não se importa. então sigo me despindo das palavras. coloco-as em desuso. não me servem para te alcançar e arranhar sua pele. nem palavra nem atitute. tudo que digo ou faço, repele, esnoba, desfaz. então, em resposta, coloco os espelhos, lado a lado, para reproduzir no infinito a única mensagem que me diz bem clara e ao pé do ouvido: o vazio. (je t'aime, moi non plus)

Um comentário:

Anônimo disse...

Tive impressão de um alguém meio perdido, estou certo bunny?
Amo!
Beijos!

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